30 de dez. de 2011

As Visões do Profeta Negro / S-VHS, 16mm e super 8mm / 7 minutos / 1999

Clique AQUI para ver o vídeo.


1998. No material em Super 8mm disponibilizado pelo Nilo Cezar, como relatei no post anterior, além das imagens da Banda Daki havia uma série de imagens feitas pelas ruas de Juiz de Fora, na década de 80. Identifiquei dois temas recorrentes: os marginalizados (mendigos, loucos, crianças abandonadas) e a paisagem arquitetônica da cidade. Me impressionaram de maneira particular as imagens dos prédios que, à época em que as imagens foram feitas, estavam ameaçados de demolição e que inspiraram movimentos em sua defesa: a Casa do Bispo e a Capela do Stela Matutina. Ambos foram realmente demolidos ainda na década de 80, apesar dos protestos, fato que conferia a estas imagens um significativo valor histórico.

Juntou-se a este material, uma série de filmes em 16mm que registravam os primeiros anos da UFJF na década de 60, filmes que encontrei jogados num armário da faculdade. Resgatei estas imagens e fiz uma "telecinagem" artesanal do material, transcrevendo-o para VHS, por pedido da minha professora à época Christina Musse. Não tenho a menor ideia de onde se encontram hoje os originais em 16mm, mas ainda conservo a cópia que fiz em vídeo. Entre estas imagens havia o registro de festivais de cultura popular, pomposas cerimônias oficiais e acadêmicas, concertos musicais, saraus de poesia e coquetéis em galerias de arte, além de uma fantástica panorâmica aérea da cidade.

Percebi que tinha em mãos a possibilidade de compor com todas estas imagens uma espécie de painel antropológico de Juiz de Fora. Naquele distante 1998, a cidade acabara de receber a fábrica de carros da Mercedez Benz e havia uma grande euforia, com a expectativa de que Juiz de Fora retomaria sua antiga vocação desenvolvimentista e vanguardista. Um pouco inspirados pelo movimento Mangue Beat, do Chico Science, eu e alguns colegas de faculdade observávamos estes fatos e acompanhávamos a vida cultural da cidade com um misto de sarcasmo e ceticismo. Reconhecíamos o aspecto algo cosmopolita de Juiz de Fora, mas percebíamos a permanência de uma mentalidade predominantemente provinciana, que dificultava a existência de expressões culturais mais contundentes. Eu traduzi esta impressão com uma frase: "Juiz de Fora é uma cidade parada no meio do caminho entre o curral e Metrópole". Meu amigo Leo Ribeiro, de maneira mais sintética, sentenciou: "Juiz de Fora é uma 'mutrópole' (palavra criada por ele e que mistura da onomatopeia 'mu', traduzindo o mugido da vaca, e a palavra 'metrópole')."

A partir desta ideia de uma "mutrópole" (ou cidade vaca, ao mesmo tempo cosmopolita e provinciana) passamos a orientar quase tudo o que fazíamos: desenhos, quadrinhos, fanzines, letras de música e vídeos. Assim, reuni todas aquelas imagens às quais já me referi, produzi mais algumas imagens de prédios e ruas emblemáticos da cidade, criei um texto e compus este mosaico que batizei de AS VISÕES DO PROFETA NEGRO. Nas imagens de Nilo Cezar, um indivíduo aparentemente louco profere um discurso com as mãos erguidas ao céu, como um profeta obscuro e decadente nas ruas de Juiz de Fora. Me pareceu uma excelente imagem inicial, já que desconfiávamos das "profecias" otimistas que proliferavam entre políticos, empresários e intelectuais, em relação a um futuro promissor para Juiz de Fora. A ideia geral do vídeo é de que as entranhas da cidade, suas misérias e seu conservadorismo, pudessem ser vistas através das suntuosas janelas de prédios neo-clássicos e modernas fachadas de vidro. Aliás, vislumbrei esta imagem síntese depois de um porre no Bar 620, onde íamos quase todas as noites e conversávamos sobre estas ideias.

O vídeo participou de uns dez festivais nacionais em 1999 e foi exibido algumas vezes pela TV Cultura no programa ZOOM.

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